quinta-feira, 19 de julho de 2007

Sobre o tempo (sobrevida)

Acho que foi mês passado que escrevi alguma coisa sobre o tempo. Andei comentando aqui que queria mais tempo. Mais tempo pra mim, pro meu amor, pra minha casa, pros meus queridos todos. Pois sigo querendo isso: simplesmente, mais tempo.

Acordo ultimamente com a sensação de que nem deu tempo pra sonhar. E isso que nem tenho dormido tão tarde. Muito menos tenho tido insônia. O que pesa são as tais responsabilidades: durmo com elas, atrapalho meus sonhos com elas e, o que seria inevitável, acordo com elas. E vale para sábado. E vale para domingo.

Sexta passada mesmo me fui com o Alisson pra Gramado. Desde o inverno de 2005 não ía a Gramado. Fomos e voltamos de Brasília. Fiquei sem emprego. Recomecei a trabalhar. E ainda não havia conseguido subir a Serra. Estava saudosa daquele céu mais próximo de mim.

Meia hora de viagem, e o celular já tocou. Pois não é que a responsabilidade - não, a irresponsabilidade, neste caso - falou mais alto e, mesmo dirigindo, pouco antes do primeiro pedágio, entre Novo Hamburgo e Taquara, atendi o telefone. Era algum produtor, pós 19h de sexta, querendo acertar alguma coisa pra manhã de segunda. E, olha, foi difícil convencer o colega de que nem era a melhor hora, nem o melhor lugar pra tratarmos de busness.

O tempo, aquele do descanso, da paz de espírito, voou. Ficamos em Gramado menos de dois dias, voltamos. Curtimos, até. Entre outros telefonemas durante o final de semana. Porque o outro tempo, o do trabalho, esse não espera para amanhã. Ou pelo menos não tem esperado.

A semana começou. Coisinhas aqui e ali. Cobranças mais aqui do que ali. Tudo andando naquele ritmo que, apesar de intenso, já está dominado. Pelo menos de segunda a sexta.

E veio a terça. Uma terça chuvosa. Rancorosa mesmo. Daqueles que tiram 50 minutos da gente num final de tarde, na Ipiranga, no curto trajeto entre a Borges e a Silva Só. Quem vive em Porto Alegre sabe que dá pra cumprir o trecho em cinco minutos. Apesar das sinaleiras e dos pardais. E sem excesso de velocidade.

Mas nesta terça, 17 de julho, a chuva, combinada com o escuro da noite, com a palidez da neblida, com os faróis altos, meio tortos, e uma tensão que já estava no ar acabou trágica. Neste dia que não deveria ter existido, a morte anunciada mostrou sua cara mais feia e expôs toda a chaga que acomete o Brasil da corrupção, do descaso, do desamor.

Dentro de um avião, brasileiros que até então haviam trilhado os mais difentes caminhos, tiveram o mesmo e irrevogável destino: ao chegarem a São Paulo, vindos de Porto Alegre, em um vôo como tantos outros, cheios de perigo, mais do que pudemos imaginar, morreram vítimas da falta de tudo.

Não tenho conseguido entender minha ansiedade pela falta de tempo. Às vezes, acuso a causa à tarceira década de vida. Outras, e isso dói, a não descendência. Apesar das tentativas. Na maioria do tempo, associo esse auto-constrangimento ao prazer de trabalhar, que acaba gerando mais e mais trabalho.

Mas depois de 17 de julho eu sei que essa ânsia, essa dor, essa irritação com o tempo tem a ver com o sentimento de pouco caso com a vida que vejo por onde passo. É na falta do simplesmente sorriso. É na ausência do respeito. É na impaciência das palavras e ds gestos. É na completa e absurda individualidade que o mundo e seu jeito tecnológico de ser tem nos imposto. E que nos tira o sono. E que, bem, nos vai impedindo de sonhar.

Paz a todos que sofrem.

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bonito o seu texto. "O tempo não pára no porto, não apita na curva, não espera ninguém", como diz a canção popular. Se eu pudesse lhe dizer alguma coisa diria para não prestar atenção no tempo. Não adianta. Quando você chegar aos 56 anos (minha idade) vai entender melhor. Um beijo. Ah, vim aqui através do blog da Ticolina, que visito regularmente mas ela nem sabe...